domingo, 2 de novembro de 2014

O VESTIBULAR E O MEDO

              Os vestibulares estão chegando e se você é candidato, um sentimento com certeza não sai da sua cabeça – o medo. É possível se preparar para o vestibular sem ele? Não! O medo, emoção mediada pela amígdala cerebral, é fundamental para o sucesso. Quando descontrolado levará ao pânico e ao stress, os quais não irão te ajudar muito. Porém, existem áreas cerebrais encarregadas de controlá-lo e usá-lo a seu favor, sob a forma de cautela e preocupação. Uma pitada de medo melhora o desempenho cerebral para a resolução de problemas e tomada de decisões. O vestibular é um grande desafio cujo resultado não é garantido nem para os mais preparados. Sem o medo da reprovação você não iria se preocupar... e deixaria de agir!

                E como isto funciona no cérebro? Além do medo, nos desafios com desfecho imprevisível, o córtex cingulado anterior também é ativado e dará o alerta: Você está diante de uma situação de risco, tudo pode dar errado, então, mexa-se e tome providências! Em seguida, outras áreas cerebrais especializadas na resolução de problemas serão ativadas para auxiliá-lo. O medo continuará ali, mas sob controle. O córtex frontal dorsolateral, responsável pelas funções executivas dará o primeiro passo levando à iniciativa, à organização e ao estabelecimento de horários, objetivos e prioridades.  Segundo passo: Combater a procrastinação, vulgarmente conhecida como enrolação e adiamento constante. Mantenha a concentração e resista às tentações. Acreditar no bom resultado é fundamental e ativará o sistema de recompensa cerebral dando-lhe motivação para seguir em frente. A motivação é também um potente facilitador da memória.
                Mantenha a amígdala cerebral sob controle! Esta área primitiva do seu cérebro tentará fazê-lo entrar em pânico. Não caia nessa! Alguma ansiedade é inevitável. A diferença entre ela e o stress está na dose! Uma ansiedade leve melhora o desempenho cerebral e se evoluir para o stress crônico, passará a prejudica-lo. A liberação prolongada do cortisol, considerado o hormônio do stress, causará diversos efeitos deletérios para o organismo como insônia, fadiga, gastrite e queda da imunidade. Causará também a morte de neurônios no hipocampo, a estrutura cerebral responsável pela memoria.
                É preciso, sim, estudar muito. Portanto, quem começou cedo terá vantagens. O cérebro não é capaz de receber, na última hora, o conhecimento de um ano inteiro. A memória tem limites e precisa de descanso. Uma boa noite de sono é fundamental para consolidar o que foi aprendido durante o dia. Portanto, deixar de dormir para estudar não é uma boa ideia! Uma boa organização permitirá manter  algumas atividades de lazer. A atividade física também ajuda a combater o stress e melhorar o desempenho do cérebro e da memória.


                Assim, pensamento positivo é bom, mas sozinho não resolve! Tem que ser acompanhado de ações positivas. Se você usou o medo a seu favor e se dedicou, acredite em você e boa sorte! 

Dra. Lucia Machado Haertel - Clínica Neurosaúde - Blumenau Fone: 3322-1522

Publicado também  no jornal de Santa Catarina  de Blumenau e Jornal O Tempo de Belo Horizonte

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O que é o medo?

                                                                                                 

Um dia destes, um biólogo desesperado procurou o meu pai. Como médico neurocientista, ao invés de um consultório ele tinha um laboratório de pesquisas sobre o cérebro na UFMG. De vez em quando aparecia alguém lá querendo se consultar e no máximo o que conseguia era um bom papo! O biólogo contou que estava com a nova namorada encostado no muro, no maior entusiasmo e... de repente começou a berrar feito louco e saiu correndo deixando a namorada sozinha! Não, ele não estava fugindo da mulher! Tinha é fobia de baratas e acabara de ver uma. Ele não tinha medo de cobras, de onça, de nada! Apenas de baratas e já tinha passado por diversas situações constrangedoras. 
                        Afinal, o que é o medo e  por que ele, às vezes, é tão irracional?
                        O medo é uma função cerebral primordial para a sobrevivência. Bastante primitiva, existe há milhões de anos e todos os vertebrados a tem. O centro do medo é a amígdala cerebral (não é a da garganta, viu?). É do tamanho de um feijão, porém extremamente poderosa. Ela recebe informações de todos os órgãos sensoriais e na percepção de algo potencialmente perigoso desencadeia uma reação de alarme que rapidamente atinge todo o organismo preparando o indivíduo para lutar ou fugir! Na pré-história era a única opção diante do inimigo já que a diplomacia e negociações vieram depois!  É a chamada reação de emergência de Cannon: A adrenalina é liberada, as pupilas se dilatam, a pressão arterial aumenta, o coração dispara, a respiração acelera, o glicogênio é mobilizado para dar energia, o sangue se concentra no coração e nos músculos. Pronto, você está preparado para correr!  Além disso, tem uns detalhes bizarros: uma outra área cerebral faz você produzir caretas características de forma automática. Se você pretende lutar faz cara de raiva e berra para intimidar o inimigo; se pretende fugir faz cara de medo, berra também e... pernas pra que te quero! Medo e raiva são reações primitivas que no homem evoluído são controladas por outras áreas cerebrais destacando-se o córtex pré-frontal. Este faz uma análise mais elaborada da situação e por isto demora alguns segundos para reagir. Às vezes não dá tempo de controlar a amígdala que age por impulso!
                         Vemos um vulto na escuridão, a amígdala dá o alarme, pode ser perigoso! A tal reação de emergência de Cannon começa. Em seguida o córtex pré-frontal analisa melhor, vê que era só a sombra de uma árvore e aborta a reação que vira apenas um susto. E se fosse um bandido armado? Esta parte primitiva do seu cérebro iria desencadear automaticamente a reação de fugir ou lutar como se ainda vivêssemos na pré-história. Mas no mundo moderno com armas de fogo não podemos mais fazer isto! Portanto, respire fundo, conte até três pra dar tempo do teu córtex frontal tomar a decisão correta de paralisar, não reagir e obedecer! Senão... a tal reação de emergência pode fazer você entrar pelo Cannon!!                                   
                        Nos quadros de ansiedade, fobia e pânico esta área cerebral funciona de forma desregulada. Na Síndrome do pânico, a reação de emergência ocorre na ausência de um perigo real. Na fobia por baratas, provavelmente na primeira vez em que o biólogo viu uma, houve uma hiperativação da amígdala, sem modulação. A reação foi memorizada passou a ocorrer a cada vez em que ele era exposto àquele estímulo, ou só de pensar nele.
                        Crianças nascem sem medo. Os pais, educadores ou o ambiente vão ensinando o que deve ser temido. É bom não exagerar nos “ensinamentos”, pois as amígdalas são poderosas, tem pouca plasticidade (“jogo de cintura”) e nunca se sabe quando uma reação fóbica acontecerá. Instalada a fobia, não adianta dizer coisas como: “ deixa de ser medroso!”ou “que bobeira, não precisa ter medo!”.  Quem vai ter que dizer isto ao fóbico é seu próprio cérebro! Algo vai ter que mudar lá dentro, nos circuitos cerebrais. O medo nem sempre é racional e cada um tem os seus! Como a fobia foi aprendida é possível fazer o cérebro desaprender, ou pelo menos aprender a controlá-la.
                         Sob controle, o medo é uma emoção fundamental, pois leva o indivíduo a agir com cautela e ter preocupações normais no dia-a-dia. Boas decisões são tomadas com a adequada avaliação de riscos e consequências. Um indivíduo que não tem medo de nada, não sabe lidar com situações de risco e toma decisões desastrosas. As áreas cerebrais capazes de controlar o medo excessivo terão que fortalecer seus circuitos inibitórios sobre a amígdala.  Criada para proteger o indivíduo de riscos reais, a amígdala tem reação mais rápida e controla-la pode demorar um pouco. Isto é possível através da ajuda de psicoterapia e se necessário, de medicamentos.
                        Assim, o melhor é não favorecer o aparecimento das fobias em crianças. Que tal começar não cantando aquelas musiquinhas inocentes de ninar como: “ boi da cara preta, pega este menino...”, “dorme nenê que a cuca vem pegar...”, “bicho papão sai de cima do telhado...”.  Não se deve utilizar o medo como ameaça para controlar o comportamento de crianças. Fale sempre a verdade! O medo é importante para proteger a criança e não pra facilitar a vida dos pais e educadores!
                        Alguns pais já entram no consultório dizendo: “Se você não ficar quieto a doutora vai te dar injeção!”
                        Eu??? Que mentira!!! Não dou injeção em ninguém!

Dra. Lucia Machado Haertel - Neurologia Infantil (47) 3322-1522
Publicado também na revista Tie Break - Blumenau-SC 


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O nosso e o deles!

A neurociência demonstrou que as diferenças entre homens e mulheres vão muito além dos órgãos genitais. Os cérebros feminino e masculino são diferentes. No entanto para decepção de muitos, estas diferenças não são tão acentuadas como a imprensa leiga propaga. Em livros do tipo “homens são assim e mulheres são assado” geralmente há um bocado de exagero. 
A maior e inquestionável diferença entre os cérebros masculino e feminino está em áreas específicas do hipotálamo, relacionadas ao comportamento sexual e opção sexual. Esta diferença cerebral faz com que homens se sintam atraídos por mulheres e mulheres por homens. Noventa por cento dos seres humanos se interessa pelo sexo oposto e isso se define no período fetal pelo efeito da testosterona.** Pára tudo!Testosterona no período fetal??? Sim. Ela está tão elevada nos fetos masculinos quanto na idade adulta, mas possuindo, nestas duas fases da vida, funções muito diferentes. Nos fetos, ao invés de promover o crescimento dos países baixos, ela atua lá em cima, no cérebro, causando mudanças significativas em um determinado núcleo do hipotálamo. É a chamada “masculinização”  do cérebro a qual definirá a atração sexual pelo sexo oposto na adolescência.  Ao nascer o bebê sofre uma redução drástica de seus níveis de testosterona até a posterior elevação na puberdade, quando assumirá sua função mais conhecida.  Entretanto, seus efeitos no cérebro já estarão definidos. Variações neste processo ocorrem em aproximadamente 10% da população que irá nascer com “cérebro padrão feminino em corpo masculino“ e vice-versa, sendo esta a base genética da homossexualidade. Assim a homossexualidade não é doença nem questão de opção ou de educação. O principal fator determinante é o hipotálamo fetal!
Outras diferenças entre os gêneros existem em relação a certas habilidades. Estas não são tão constantes nem tão evidentes quanto as diferenças hipotalâmicas mas são estatisticamente significativas na população.  Uma importante teoria sugere que em geral, as mulheres tem maiores habilidades de empatia, ou seja, capacidade de entender pessoas, sentimentos e emoções. Os homens, por sua vez,  possuem maior capacidade de sistematização, ou seja, habilidade para entender mecanismos, máquinas e como as coisas funcionam. **   
Outra diferença favorável aos homens está uma maior habilidade na orientação espacial. Eles, em geral, não se perdem facilmente dentro de sua própria cidade, sabem olhar mapas do lado certo e não falam “vire à direita” enquanto apontam a mão para o lado esquerdo. Mulheres não se orientam pelo senso de direção e estimativa de distância. Vão memorizando marcos pelo caminho em lugares menores. Assim, são melhores do que os homens para se orientarem num  shopping, memorizando o lugar das lojas!
Isto faz sentido evolutivamente! Lembrem-se, nosso cérebro foi moldado na pré-história. O homem tinha que andar longas distâncias para caçar e precisava achar o caminho de volta. Mulheres cuidavam da prole e coletavam alimentos nas proximidades. Ficavam longos períodos juntas, cuidando de um bando de crianças e .... conversando!   As mulheres em geral possuem maiores habilidades de comunicação devido a um maior número de sinapses por neurônio nas áreas de linguagem. Quanto maior o número de sinapses, maior a comunicação entre os neurônios. Eles estão certos quando dizem que nós falamos demais e queremos sempre discutir profundamente a relação. É o cérebro feminino, mulherada! Mas  não somos nós que falamos demais – são os nossos neurônios!
As mulheres também percebem melhor pequenos objetos, detalhes e diferenças estéticas. Por isto, para eles,  é difícil entender porque mesmo com dezenas de pares de sapatos, nenhum combina com aquela determinada roupa e que você precisa sim, urgentemente, de mais um. Isso sem falar na necessidade de múltiplos acessórios de moda. Se eles têm extrema dificuldade para enxergar o leite que está lá no meio na geladeira não vão prestar atenção no seu novo maxi colar. O homem tem um cérebro mais objetivo, gente! Eles gostam de coisas simples e grandes, não de coisas pequenas e cheias de detalhes. Não são de forma nenhuma difíceis de agradar.
Concluindo, as diferenças entre os gêneros envolvem também o cérebro. Sabe-se, por exemplo, que o cérebro do homem tem mais neurônios do que o da mulher, mas tal fato não lhe dá qualquer vantagem em termos de inteligência. Realmente os homens costumam ser melhores do que as mulheres em orientação espacial, números e matemática. Eles podem ter dificuldades para perceber que você colocou mega hair e que seu cabelo cresceu da noite para o dia ou  que você está de roupa nova, mas o rombo no cartão de crédito jamais irá passar despercebido!

Lucia Machado Haertel, www.neurosaude.com.br. (47) 3322-1522
Publicado também  no Jornal "O tempo"de Belo Horizonte e revista Tie Break de Blumenau.  
**Existem outros interessantes estudos sobre a influencia da testosterona fetal sobre o desenvolvimento cerebral, personalidade, comportamento e habilidades masculinas e femininas. Recomendo a leitura do livro A Diferença essencial. de Simon Baron Cohen 



sexta-feira, 27 de junho de 2014

PORQUE O CÉREBRO VICIA?

         Dia  26 de junho, é o dia mundial de combate às drogas e é comum que as campanhas que visam desestimular seu consumo mostrem pessoas praticamente já destruídas por elas.  As imagens, embora fortes, podem não atingir os potenciais usuários e os iniciantes. Nesta fase eles estão com a autoestima elevada e um contraste tão extremo passa a sensação de que isto nunca acontecerá com eles. É preciso explicar como se chega lá e iniciar admitindo que as drogas causam prazer sim, e, por isso, viciam. Elas atuam diretamente sobre o sistema de recompensa do cérebro, o qual é responsável pela sensação de prazer nas situações cotidianas normais, gerada pela liberação de dopamina. Sob o efeito das drogas, a quantidade de dopamina liberada é muito maior, proporcionando uma sensação intensa de prazer.  Esta ativação exagerada, no entanto, é agressiva para o cérebro, que irá se defender. Como? Reduzindo o número de receptores para a dopamina.  Assim, mesmo que a quantidade liberada pela droga seja a mesma, apenas uma porção cada vez menor irá efetivamente se ligar aos neurônios. Este é o mecanismo da dependência e faz com que o sistema de recompensa do cérebro se torne menos sensível ás drogas. O usuário ficará também insensível aos prazeres do dia a dia, que serão abandonados.  Apenas doses maiores e mais frequentes da droga conseguirão proporcionar o bem-estar almejado. Assim, a pessoa em questão passará a apelar para drogas mais potentes e a vida passará a girar em torno de obtê-las. Existe uma predisposição genética que determina maior risco de dependência em determinados indivíduos e fatores ambientais agravantes. No entanto, a dependência é um mecanismo cerebral involuntário que ocorre automaticamente, independente da vontade e do controle do indivíduo. É o cérebro quem se vicia. Portanto, é possível, sim, chegar ao fundo do poço. Para evitar este desfecho, a única garantia é não  arriscar! Portanto, deixe o seu cérebro se “viciar“ apenas em atividades saudáveis como esportes, cultura, música, viagens, amizades... Drogas, é possível ser feliz sem elas! 


quarta-feira, 11 de junho de 2014

O BEBÊ QUE NÃO DORME!


Hoje vou abordar um assunto que costuma ser motivo de aflição para os pais: O sono (ou a insônia) dos bebês. Algumas mães chegam ao consultório desesperadas, com olheiras e claros sinais de privação crônica de sono. Ao seu lado, a criança, que supostamente não dorme, está geralmente alerta, ativa e feliz! O desconhecimento sobre a fisiologia do sono na infância faz com que a insônia, na maioria das vezes, seja favorecida pelos próprios pais.  

                                                    
 O sono é uma função do encéfalo que também passa por um processo de desenvolvimento. No recém nascido ele ocorre aleatoriamente em períodos de 2 a 4 horas ao longo das 24 horas. O amadurecimento é rápido. Aos 6 meses o sono já possui quatro fases e está sincronizado ao ciclo dia e noite. Nesta época diminui também a necessidade biológica de se alimentar à noite, ou seja, aos 6 meses os lactentes já estão biologicamente preparados para dormir a noite toda sem comer! Só faltou escrever isto no manual de instruções dos bebês! Até um ano há ainda a necessidade de dois cochilos diurnos e até os 3 ou 4 anos, um cochilo. Algumas crianças continuam a dormir depois do almoço por hábito o que não é problema. No entanto, nenhuma criança deve ser forçada a dormir de dia após esta idade. Faltou também avisar isto às creches!
 A partir dos 3 a 4 meses o intervalo entre as mamadas deve ser aumentado progressivamente. É a manutenção da rotina de recém nascidos e a introdução de outros (maus) hábitos pelos pais que atrapalha a consolidação natural do sono. A criança passar a ter dificuldade para iniciar o sono, acorda várias vezes e tem que ser alimentada.  Faltou também escrever no manual dos bebes que despertares breves durante o sono são fisiológicos, todo ser humano tem. Não dá pra desligar a criança da tomada e só religar de manha. Ela vai acordar! Estes despertares são breves e geralmente não nos recordamos deles pela manhã. Com a presença da mãe, no entanto, a criança se tornará alerta... pra brincar! Bebes só entendem duas coisas: o que é ruim e o que é bom. Ganhar colo, mamadeira e brincar é bom demais! Então, voltar a dormir porque? Acordar, chorar e ser prontamente atendida se tornará uma rotina. A criança terá dificuldade para voltar a dormir na ausência das circunstâncias que foram condicionadas ao início do sono como: ser embalada no colo, dormir mamando no peito ou mamadeira, luz acesa, presença da mãe na cama, dormir vendo televisão e até mesmo passear de carro pra pegar no sono. E assim toda noite, várias vezes por noite...
 É a  insônia por associações inadequadas ao início do sono. 







A criança deve aprender a dormir sozinha em condições que possam ser facilmente reproduzidas nos despertares fisiológicos. Assim voltarão a dormir sozinhas se acordarem no meio da noite.  É bom fazer isto antes que elas aprendam a sair do berço! A partir daí, se não forem prontamente atendidas, irão para a cama dos pais. Estabelecer rotinas ficará muito mais difícil e elas passarão decidir quando e como vão dormir, sempre testando os limites dos pais.



A fome condicionada
Para os pais, o choro dos bebes é sinal de fome e assim a cada berro a comida virá rapidinho! Os despertares fisiológicos geralmente ocorrem a cada 2 horas, após cada ciclo das quatro fases do sono. Assim serão até cinco mamadeiras ou o peito noite adentro quando não existe mais a necessidade biológica. O excesso de oferta alterará a secreção de hormônios e enzimas digestivas gerando a “fome aprendida ou condicionada”. A fome é um sinal emitido pelo cérebro quando o organismo está preparado para receber a comida condicionada àquele horário. Não indica portanto, uma necessidade e ainda passará a despertar a criança. Comer a noite além de causar cáries, otites e obesidade, provoca cólicas e maior produção de urina aumentando o número de despertares e criando um ciclo vicioso impedindo a consolidação do sono.

É de conhecimento geral que o hormônio de crescimento é secretado na fase IV do sono e isto gera preocupação quanto a possível privação de sono. Se a criança está ativa, alerta e brinca normalmente o volume de sono deve estar adequado. A maior quantidade de sono fase IV ocorre nas primeiras horas de sono, quando elas parecem dormir que nem pedra, garantindo o crescimento! Prejuízo no crescimento só ocorre nos casos de distúrbios de sono mais graves como na apnéia obstrutiva do sono. Crianças não devem roncar ou respirar apenas pela boca! Fica o alerta! Outras condições que merecem atenção médica e que podem interferir com o sono são refluxo, asma e alergias alimentares.
As famosas cólicas são causadas por um desbalanço entre as concentrações de serotonina e melatonina nos primeiros três meses de vida. A serotonina causa contração da musculatura lisa e a melatonina causa relaxamento. As cólicas refletem um processo fisiológico normal de desenvolvimento. Seu término coincide com a época de início da consolidação do sono noturno. É importante descontinuar as condutas adotadas na fase das cólicas para não inviabilizar este processo. Se não houver interferência dos pais, os bons hábitos de sono costumam se desenvolver normalmente. É importante reforçar que os hábitos de sono são aprendidos e se uma criança passou meses ou anos com um padrão inadequado, levará algum tempo para reaprender um novo padrão. Apenas a persistência poderá resolver o problema. O uso de medicamentos raramente é necessário. 
 Querida mamãe, se sua consciência não permitir deixar seu filho chorar um pouco para aprender a dormir, pense: Você também precisa dormir. Uma mãe que dorme bem terá paciência, bom humor, criatividade para brincar e estimular seu filho com todo amor e carinho no dia seguinte. Portanto durmam bem, mães e filhos!

Outras dicas para que os pequenos durmam bem:

1.        A criança deve aprender a iniciar o sono sozinha. Diante do choro condicionado o ideal é deixa-la chorar ou não atende-la imediatamente num processo gradual. O atendimento deve ser monótono e sem atrativos, apenas a presença no quarto até que fiquem quietas. No máximo um balanço suave no próprio berço, sem pegá-la no colo. Sair do quarto para que inicie o sono sozinha. Em caso de novo choro e nos dias seguintes demorar cada vez mais para atendê-la. A criança geralmente aprende a dormir sozinha em uma semana.
2.        Dissociar a alimentação do início do sono. Amamentá-la em outro ambiente e não permitir que inicie o sono no peito. Colocá-la acordada no berço e usar a mesma tática nos cochilos diurnos.
3.    Rotinas de ir para a cama devem ser rigorosas. O quarto deve estar silencioso, com temperatura agradável e luz reduzida. Fornecer uma refeição leve ou mamada antes, para que não vá dormir com fome.
4.        O banho é geralmente uma atividade estimulante para os pré-escolares e deve ocorrer 2 horas antes do sono. O superaquecimento da criança pode atrasar o início do sono.
5.        Colocá-la para brincar no sol logo que acordar. O cochilo diurno por necessidade ou hábito deve ocorrer no início da tarde, durando aproximadamente uma hora e sob a luz natural, para diferenciá-lo do sono noturno, ajudando assim a sincronizar o relógio biológico ao ciclo noite e dia.
       6.       Para dormir é necessário estar com sono e para que ele ocorra na hora desejada é necessário fixar o horário de acordar. Manter aproximadamente o mesmo horário nos sete dias da semana.
7.        A necessidade de sono vai diminuindo com a idade. Verificar a média adequada à idade e considerar todos os cochilos diurnos no cálculo. Cochilos de 10 a 20 minutos no carrinho, podem reduzir o sono noturno em horas. Dormir no final da tarde pode adiar o início do sono noturno em até 6 horas.
8.        Exercícios vigorosos devem ser evitados 3 horas antes de deitar. Evitar bebidas cafeinadas após o almoço, incluindo refrigerantes e chocolate.
9.        Televisão, computador, vídeo game e excesso de luz são atividades excitantes e devem ser desligados uma hora antes de deitar.  Desenvolver uma seqüência padronizada de eventos para preparar o sono como arrumar o material, beber leite, pijama, escovar dentes, ler ou escutar uma história, apagar as luzes, beijinho e boa noite!
Dra. Lucia Machado Haertel - Neuropediatra CRM 6338
Clínica Neurosaúde - Blumenau 
(47) 3322 1522


terça-feira, 27 de maio de 2014

A MARCHA DA MACONHA

       No último domingo manifestantes pró-legalização da maconha foram às ruas. A discussão desse tema é válida desde que usados argumentos corretos. Há quem afirme o absurdo de que a maconha é natural e, portanto, não faz mal. Dizem também que é um santo remédio!  Se fosse assim, poderíamos experimentar também plantas como a cicuta, a “comigo-ninguém-pode”, a mandioca brava e cogumelos psicodélicos, todas naturais. 
        A maconha é uma droga mais leve,  porém está longe de ser  inofensiva.  Seu efeito deletério sobre a memória está comprovado, sobretudo quando o uso inicia-se na adolescência. Além disto, favorece o aparecimento e o agravamento de algumas doenças psiquiátricas. O cérebro do adolescente é especialmente vulnerável às drogas e propenso à dependência, inclusive ao álcool e à maconha. 
       Quanto ao uso medicinal, só irá usar maconha quem aceitar o ônus ou o bônus de ficar “chapado” como efeito colateral.  O turismo da maconha medicinal já é uma realidade nos estados americanos que a legalizaram para este fim. Parece-me estranho que Aspen, uma sofisticada estação de esqui, seja um dos destinos mais procurados pelos supostos  “doentes” que buscam a “cura pela erva”.   Os cientistas mais renomados são contra o uso da planta fumada, um composto de 460 substâncias, para fins medicinais.  Existem, no entanto, pesquisas promissoras utilizando-se apenas um de seus componentes, o Canabidiol, que quando isolado, deixa de ser maconha e passa a ser uma molécula como outra qualquer. Comprovada sua eficácia e segurança, a classe médica será favorável ao uso do canabidiol isolado como medicamento. 
        É correto afirmar que a legalização desvincularia a aquisição da maconha do ambiente do tráfico das drogas pesadas. O tráfico gera violência e criminalidade e é válido discutir se vale a pena combate-lo no caso de uma droga mais leve. No entanto, a exemplo do álcool, mesmo que a maconha só fosse liberada para maiores de 18 anos, como evitar que os adolescentes tenham acesso à droga? E quanto ao seu efeito entorpecente no trânsito?  No Brasil, não há como controlar. Portanto, entre prós e contras, sou contra. Já temos o álcool, uma droga recreativa lícita causadora de acidentes de transito e acessível aos adolescentes. Não precisamos de mais uma.  

Dra. Lucia Machado Haertel - Neurologista Infantil e da Adolescência 
Clínica Neurosaúde-Blumenau (47)33221522

Publicado no Jornal de Santa Catarina em 27/05/2014
 http://www.clicrbs.com.br/jsc/sc/impressa/4,182,4510530,24405
Publicado no jornal "O Tempo"de Belo horizonte em 09/06/2014 

domingo, 25 de maio de 2014

APNÉIA DO SONO NA INFÂNCIA




É comum ouvirmos falar sobre a apneia do sono em adultos. O que poucos sabem é que a Síndrome da Apnéia do Sono Obstrutiva, (SASO) é também comum na infância. A SASO infantil pode ocorrer em qualquer idade  sendo mais comum no pré escolar. Pode ser definida como: episódios repetitivos de interrupção total ou parcial do fluxo das vias aéreas superiores com manutenção do esforço respiratório.  É causada pela redução do calibre das vias aéreas. A fragmentação do sono e as alterações nas trocas gasosas podem causar prejuízos à saúde da criança.
A principal causa de obstrução anatômica é a hipertrofia das adenóides, seguida pelas alterações craniofaciais, particularmente a retromicrognatia e alterações do palato . A obstrucão é acentuada durante o sono devido ao relaxamento muscular.  No entanto, amígdalas e adenóides sozinhas nem sempre são capazes de causar SASO. Algumas crianças têm amígdalas e adenóides enormes sem SASO enquanto outras continuam tendo apnéia mesmo após retirá-las.  Não se pode, portanto, considerar apenas o seu tamanho para o diagnóstico de SASO. Além disto, algumas características da SASO na infância podem dificultar o diagnóstico.
No quadro clássico, observa-se ronco interrompido por pausas ou engasgos e associados a movimentos ou despertares. Entretanto alguns pacientes, especialmente lactentes ou aqueles com fraqueza muscular, podem não roncar. A história clínica também inclui sono inquieto, sudorese noturna , boca seca, cefaléia matinal, dormir em posições não usuais como sentadas ou com hiperextensão do pescoço, arritmias sinusais, enurese, respiração oral.  No entanto, o quadro clínico clássico não é a apresentação mais freqüente na infância. A Síndrome da Resistência das Vias Aéreas Superiores, (SRVA), e a Hipoventilação Obstrutiva Contínua são muito comuns. É necessário alertar para a existência destas formas mais leves de SASO, que tem como principal conseqüência distúrbios neurocomportamentais  e de aprendizagem e que são muito pouco diagnosticadas no nosso meio.
A SRVA é caracterizada por ronco contínuo e/ou respiração oral associados à repetidos microdespertares relacionados a esforço respiratório, sem apnéia, hipopneia ou dessaturação identificável, mas com aumento da pressão negativa esofageana. É comum a presença de respiração paradoxal. Está associada a significativo prejuízo cognitivo e comportamental em crianças, incluindo hiperatividade, déficit de atenção, dificuldades de aprendizagem irritabilidade e agressividade.  O ronco ocorre na maioria dos casos, mas existe a SRVA sem ronco. A Hipoventilação Obstrutiva consiste em longos períodos de obstrução parcial, acompanhada por alterações gasosas mas não de apnéias ou hipopnéias francas.  
O principal diagnóstico diferencial da SASO é o ronco primário que afeta 10% das crianças. Esta distinção não pode ser feita clinicamente, pela história, avaliação do ronco ou do tamanho das adenóides. As formas mais leves de SASO não são percebidas clinicamente porque não existe a apneia franca. Portanto, o ronco primário só pode ser distinguido da SASO pela polissonografia em clínica de sono, que é o exame de escolha para diagnóstico e avaliação de gravidade.
Diante destas características é fácil concluir que na maioria das vezes, apenas os casos mais graves com apneias evidentes são diagnosticados. O reconhecimento de prejuízos neurocognitivos  em crianças com formas mais leves tem feito os clínicos repensarem o limiar de distúrbio que requer intervenção.

CONSEQÜÊNCIAS
 As conseqüências da SASO, dependem da gravidade do quadro e vão desde os distúrbios neurocomportametais já descritos até hipertensão pulmonar e sistêmica e atraso de crescimento. A sonolência diurna, característica do adulto, é vista apenas em crianças maiores e adolescentes.
A hipoxemia representar risco potencial para o vulnerável cérebro em desenvolvimento. A hipertensão arterial sistêmica associada à SASO, comum na população adulta,  ocorre devido à ativação simpática intermitente durante os microdespertares. Na infância, devido a grande complacência vascular a elevação da PA não é tão proeminente mas pode contribuir para futura hipertensão no adulto.
Recentemente tem se dado maior ênfase às conseqüências comportamentais e cognitivas da SASO. Tem se verificado maior incidência de TDAH, (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), em crianças com SASO. Os sintomas são semelhantes ao quadro típico de TDAH. A história do sono deve ser sempre pesquisada nestes pacientes, principalmente se o caso não preenche completamente os critérios ou não houve resposta ao tratamento. Se existe relato de ronco está indicado realizar uma polissonografia.  Existem inúmeros relatos na literatura de melhora do desempenho, aprendizado e comportamento após o tratamento. O tratamento tardio pode resultar em déficits acumulados no aprendizado que necessitarão de apoio pedagógico.
A cada apnéia ou hipopnéia segue-se uma reação de despertar observada ao eletrencefalograma que não se torna consciente, mas que permite um aumento do tônus muscular necessário para permitir uma inspiração profunda que encerra a apnéia e normaliza a saturação de oxigênio. Nas formas mais graves podem ocorrer centenas de microdespertares e isto dificulta a passagem para o estágio mais profundo do sono, a fase IV, podendo afetar a secreção do hormônio de crescimento que ocorre nesta fase. O atraso de crescimento frequentemente observado tem múltiplas causas além da possível redução na secreção do GH.  A hipoxemia, acidose, aumento do esforço e do gasto energético da respiração são os principais fatores envolvidos. Além disto, perda de apetite devido à perda do olfato, disfagia e inapetência podem contribuir.

TRATAMENTO

     Um dos maiores dilemas na medicina do sono na infância é quando tratar o distúrbio respiratório. Não há duvidas quanto ao tratamento da SASO severa que pode levar a cor pulmonale e atraso no crescimento. Existe também consenso de que o ronco primário não deve ser tratado com cirurgia. O grupo com alterações polissonograficas discretas é o controverso e o limiar de distúrbio que deve ser tratado não está bem definido na literatura. A adenotonsilectomia é o tratamento de escolha na maioria dos casos e geralmente leva a cura.  Há recuperação da velocidade de crescimento, assim como das funções cognitivas e do comportamento após a cirurgia.  
Nos casos de SASO em que as amígdalas e adenóides são pequenas porém existem outros fatores como dismorfismos faciais, Síndrome de Down e Paralisia Cerebral associados, a cirurgia deve ser considerada. Levando em consideração que a SASO resulta de fatores anatômicos e funcionais, aumentar a via aérea o máximo possível é sempre desejável nestes casos. Porém, uma reavaliação posterior será necessária para verificar a necessidade de tratamento suplementar.   Algumas alterações do palato e da ardada dentária podem causar SASO e podem ser tratadas com aparelhos ortodonticos.            Nos pacientes que não melhoram ou quando a adenotonsilectomia é contra indicada, o CPAP passa a ser uma  opção. Cirurgias craniofaciais são indicadas em casos específicos assim como perda de peso.  
   Alguns pacientes continuam a roncar e ter apneias após a cirurgia. Nestes casos, a hipertrofia  adenoamigdaliana pode ser apenas um fator exacerbador em pacientes que tem alguma outra anomalia estrutural ou funcional. Uma nova polissonografia deverá ser solicitada após 8 semanas de pós operatório. 

CASO CLÍNICO

   Criança de 9 anos, sexo masculino, realizou adenoamigdalectomia aos 4 anos e referia ausência de ronco desde então. Foi à consulta devido à dificuldade de aprendizado significativa, necessidade de acompanhamento psicopedagógico, apatia sinais compatíveis com déficit de atenção sem hiperatividade. Foi iniciado tratamento com metilfenidato com pouca resposta. A anamnese do sono evidenciou sonolência diurna, ausência de ronco, sono perturbado, inquieto, presença de despertares e a opção da própria criança de dormir com dois travesseiros. Ao exame clínico evidenciou-se micrognatia. A polissonografia, (abaixo), evidenciou índice de 12 apnéias/hipopnéias por hora, 20 microdespertares por hora, saturação mínima de 85% e redução na proporção das fases IV e REM do sono. O quadro foi considerado grave pelos parâmetros polissonográficos infantis. Foi indicado o uso do CPAP até que se estudasse melhor a possibilidade de cirurgia bucomaxilofacial .

Fig.1: Amostra da polissonografia do paciente acima evidenciando apnéia, hipopnéia, dessaturação e microdespertar com ativação simpática intermitente demonstrada através do aumento da freqüência cardíaca.

www.neurosaude.com.br – Setor de distúrbios de sono- (47) 3322-1522 - Blumenau

terça-feira, 29 de abril de 2014

A importância do sono

A importância do sono fica evidente quando entendemos a complexidade dos sistemas cerebrais envolvidos na regulação do ciclo sono e vigília. Ao contrário do que se imagina, durante o sono cérebro não está inativo, apenas fecha as portas de entrada aos estímulos do ambiente exterior, fazendo apenas expediente interno! Existe atividade cerebral em todas as fases do sono especialmente durante o sono REM. Nesta fase ocorrem os sonhos e cérebro está tão ativo quanto em vigília.
Experiências extremas em que animais de laboratório foram impedidos de dormir por vários dias seguidos resultaram na morte do animal em algumas semanas devido a um descontrole metabólico, aumento incontrolável da temperatura corporal, caquexia e queda da imunidade. Questionáveis pela crueldade, tais experimentos provaram que o sono é fundamental para a vida. 
O sono tem uma função reparadora para o corpo e para o cérebro. Ocorre redução da pressão arterial, diminuição dos batimentos cardíacos, relaxamento muscular, redução da produção de urina, ou seja, os vários sistemas descansam durante o sono.
 Alguns hormônios são secretados durante o sono. O mais conhecido é o hormônio de crescimento que é secretado na fase IV.  Já o cortisol, hormônio relacionado ao stress tem seu nível reduzido durante o sono. Varias outras substâncias e hormônios tem sua secreção relacionada ao ciclo sono-vigília como a insulina e os hormônios tireoideanos. Isto é importante para o bom funcionamento e equilíbrio energético do organismo.   O sono também é importante para manter a capacidade do cérebro de controlar a temperatura corporal, a termorregulação.
            Durante o sono REM ocorre intensa atividade cerebral e acredita-se que nesta fase há a consolidação do que foi  aprendido durante o dia. É como se o aprendizado ocorresse em duas fases, a primeira durante o dia com o estudo e a segunda durante a noite quando são consolidadas. Mas para isto acontecer é necessário uma noite inteira de sono com todas as suas fases. O sono REM predomina na segunda metade da noite, portanto dormir menos numa véspera de prova vai comprometer a consolidação  do que foi estudado durante o dia. Passar a noite em claro ou acordar de madrugada para estudar em cima da hora também não é uma boa idéia.  Durante o sono alguns neurotransmissores  importantes para o estado de alerta e atenção , como a noradrenalina, encontram-se inibidos. Isto é importante para restabelecer seus níveis e garantir uma maior eficiência destas funções cerebrais no dia seguinte. Assim, dormir bem é fundamental para o aprendizado.

Matéria publicada na revista UNIMED Edição 73 http://www.mundieditora.com.br/i/190179/23
·         Leia também o artigo “o sono da beleza” neste blog.

O sono de má qualidade e suas consequências
A perda eventual de uma noite de sono tem como consequência apenas a perda de produtividade no dia seguinte devido à falta de atenção, sensação de cansaço e sonolência. O organismo consegue compensar na noite seguinte.
O sono de má qualidade ou a privação de sono de forma crônica pode, entretanto causar prejuízos ao organismo. O cortisol um hormônio que é liberado em vigília precisa ter seus níveis reduzidos durante o sono. A privação crônica de sono altera o controle dos níveis de cortisol. O cortisol em excesso leva a queda de imunidade, morte neuronal e redução da neurogenese no hipocampo, o responsável pela aquisição de novas memórias.  Altera também a resposta do organismo ao stress, causa morte celular e envelhecimento precoce.
Quem não dorme bem também tem maior tendência a obesidade. Durante o sono os níveis de leptina, hormônio que inibe o apetite aumenta. O nível de grelina e insulina diminuem porque as necessidades energéticas diminuem. Dormir pouco ou dormir mal altera a regulação destes hormônios levando ao aumento de ingestão de alimentos e alteração do metabolismo energético favorecendo o acumulo de gordura.
A sonolência excessiva diurna é o principal sintoma nos casos dos distúrbios intrínsecos do sono que levam ao sono não reparador. O mais comum e mais grave é a Síndrome da apnéia do sono obstrutiva*. Nestes casos a presença de ronco dá o alerta e a investigação é feita através da polissonografia. .


Suite para a realização de polissonografia. 
Clínica Neurosaúde Blumenau- Setor de Distúrbios do sono. Fone (47) 3322-1522   

 * Aguardem a postagem do artigo: “Apneia do sono”, neste blog

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Autismo e Asperger - Diagnósticos mais claros

 Considerado, de forma geral, um distúrbio de desenvolvimento causado por condições genéticas, o autismo tem como característica fundamental o prejuízo na comunicação social e a presença de comportamentos peculiares. Alguns sinais como a dificuldade de contato ocular podem ser percebidos desde os primeiros meses de vida. 
A neurologista infantil Lúcia Machado Haertel explica que crianças com, aproximadamente, um ano e meio de idade ainda não têm a comunicação verbal totalmente desenvolvida. Por isso, nessa idade, deve existir uma comunicação não verbal bastante rica, com manifestações das emoções através de mimicas, gestos e expressões faciais diversas. “Entre um e dois anos, a criança observa muito as expressões faciais da mãe. A falta dessa interação é um sinal de alerta precoce para o diagnóstico do autismo. Ao longo dos próximos meses, o quadro vai se definindo melhor. Outros sinais na criança são a falta de comportamentos de imitação, de apontar, mostrar e trazer objetos de interesse para compartilhar”, diz a neuropediatra.
Geralmente, há uma falta de interesse por pessoas, não havendo uma reciprocidade social. A ausência ou dificuldade na comunicação social priva a criança de estímulos adequados para o desenvolvimento. Por isso, é muito importante o diagnóstico e a intervenção precoces. Mesmo não existindo uma cura, muitos dos sintomas podem ser amenizados com terapias de estimulação. Os autistas mais graves podem não desenvolver a linguagem verbal e apresentar grandes limitações necessitando de suporte significativo ao longo de toda a vida.  Outros com formas leves, bom  nível intelectual e de linguagem podem achar um nicho que se adapte a suas habilidades e interesses especiais e, assim, viver e trabalhar de forma independente. Mas permanecem socialmente  vulneráveis, com dificuldades para lidar com as demandas diárias sem ajuda”, salienta Dra. Lúcia.
Critérios para diagnóstico do Autismo
As limitações e prognóstico estão relacionados com o nível de gravidade  do transtorno. Têm melhor prognóstico aqueles que não apresentam comprometimento intelectual e conseguem desenvolver uma linguagem funcional até os cinco anos. O diagnóstico é feito clinicamente.  Os critérios mais aceitos mundialmente estão  no Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - DSM), publicado pela Academia Americana de Psiquiatria. 
 Síndrome de Asperger
Há um ano o DSM passou por uma revisão que aboliu a Síndrome de Asperger como diagnóstico. Na atual classificação do DSM 5, só existe o Transtorno do Espectro Autista dividido em três níveis de gravidade.  “As características básicas continuam as mesmas nos três níveis, mas variam na intensidade justificando a denominação de Espectro Autista ”, explica a neurologista.
 Dra Lucia explica que, desde 1994, com a inclusão no DSM-4, a Síndrome de Asperger vem causando controvérsias. O único critério que a diferenciava do autismo leve era que, na síndrome de Asperger, não poderia haver atraso no desenvolvimento da linguagem.  Os critérios antigos davam margem a interpretações pessoais principalmente por não especialistas. Isso, associado à popularização e utilização indiscriminada do DSM como se fosse um manual de instruções, causou uma ‘epidemia’ mundial da Síndrome de Asperger.  Assim, com as mudanças atuais no DSM 5 haverão diagnósticos mais precisos. “Os pacientes anteriormente diagnosticados com Síndrome de Asperger deverão ser reavaliados e, se preencherem os novos critérios, serão considerados autistas. Se não preencherem, deverão ser avaliadas outras possibilidades de diagnóstico diferencial. Com critérios mais bem definidos,  parte dos pacientes não poderão ser considerados autistas”, afirma a neurologista.
Afinal, crianças podem ter dificuldades de socialização também por timidez, fobia social, imaturidade no desenvolvimento, deficiência intelectual, falta de limites, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, transtorno desafiador opositivo, entre outros. Outro fato que costuma ser indevidamente avaliado é a presença de padrões repetitivos de comportamento e interesse.
“Pré-escolares normais apresentam fases em que preferem um tipo de brinquedo, querem ver o mesmo filme ou escutar  a mesma historia várias vezes e isso isoladamente não é diagnóstico de autismo. Afinal que menino normal nunca teve uma fase de paixão por dinossauros? A repetição faz parte do aprendizado infantil. Para a suspeita de autismo os padrões de interesses restritos devem  intensos e anormais em relação aos padrões habituais da idade, como, por exemplo, uma criança que passa horas enfileirando carrinhos sem brincar com eles ou um menino de  5 anos que se comunica mal mas já memorizou todas as marcas de carro e só quer desenhar placas de transito.”, explica. O diagnóstico correto é importante para que haja uma intervenção adequada.
Versão resumida publicada na revista UNIMED de Blumenau, edição 79.
http://www.mundieditora.com.br/h/i/8512443-unimed-79-digital
 Mais informações:  Dra. Lúcia Machado Haertel
Neurologia Infantil – CRM 6338   (47) 3322-1522



sexta-feira, 4 de abril de 2014

E aquela história dos 10% do cérebro?



                Será que usamos mesmo apenas 10% do nosso cérebro? 
                Em relação a esta frase, a única coisa que a ciência não consegue explicar é como este mito surgiu. Afinal, a afirmação não faz nenhum sentido. A natureza não passaria centenas de milhares de anos aperfeiçoando sua obra prima, desenvolvendo um cérebro com 86 bilhões de neurônios para depois usar só 10%.


Originar neurônios a partir de células-tronco até eles estarem armazenando informações é um processo muito complexo. Neurônios custam muito caro! Nossas trilhões de sinapses são oriundas da síntese de proteínas, e a bainha de mielina, material isolante que possibilita a condução do impulso elétrico pelo axônio, é constituída por lipídeos. Há milhares de anos, nutrientes nobres como proteínas e lipídeos não podiam ser encontrados em supermercados!  Evolutivamente, desperdiçar matéria prima para formar e manter tantos neurônios inúteis não faria sentido algum. Desperdício é coisa do homem moderno, e neste ponto, ter um supercérebro não vem ajudando muito! Além disso, neurônios são nobres e vivem na mordomia, cercados pelas células da glia, suas assistentes pessoais. Sua função é alimentar, proteger e desintoxicar nossos neurônios fazendo hora extra e adicional noturno na adolescência! Manter tantos colaboradores também é biologicamente caro. Com apenas 2% do peso corporal, o cérebro consome 20% da energia do organismo.
                 Alguns afirmam que os 90% serviriam de reserva para recuperar lesões. Isso seria ótimo! Mas, infelizmente, nosso cérebro foi moldado na pré-história e antes do advento da medicina, a seleção natural era cruel. Só os mais fortes sobreviviam, e a expectativa de vida era extremamente curta. Ter reserva não faria sentido! Portanto, querido adolescente, se você beber, bater o carro e sofrer uma lesão cerebral poderá até se recuperar, mas não à custa dos 90% da dita reserva e sim do trabalho dobrado dos neurônios que sobraram! Neurônios não se regeneram. Pensem nisso e cuidem bem dos seus!
                A ciência já provou que neurônios inativos morrem. Portanto, não existem neurônios inativos e nós usamos sempre 100% do nosso cérebro. Ponto final. Mesmo no cérebro infantil, o qual possui um maior número de neurônios, eles estão todos ativos e formando circuitos, ainda que mais básicos. Com a idade, vai ocorrendo uma seleção dos circuitos mais úteis e eficientes, e neurônios não utilizados sofrem um processo de morte natural programada.
Usamos sempre todo o potencial do nosso cérebro para determinada atividade. O que pode variar é a eficiência. Esta variação pode ser significativa de um dia para o outro, dependendo dos nossos chamados “sistemas modulatórios de projeção difusa”, os quais “temperam” aqui e ali o nosso cérebro com neurotransmissores como a noradrenalina, a dopamina e a serotonina entre outros. Tais “temperinhos” regulam nosso estado de alerta, de atenção, de motivação e de humor, influenciando significativamente o nosso desempenho e nossa memória a cada momento. Todos sabem como é difícil ler um texto quando estamos sonolentos, desatentos, desanimados ou de mau humor!
                Mas se já usamos 100% do cérebro, como podemos aprender coisas novas e melhorar nossas habilidades?
A capacidade de aprender é ilimitada. Você pode aprender qualquer coisa - desde que haja dedicação. A base do aprendizado é a formação de novas conexões sinápticas, o fortalecimento das já existentes e a formação de novas associações entre neurônios, criando circuitos mais complexos. Não ocorre através do recrutamento de neurônios que estavam à toa! Na verdade um aprendizado quando bem consolidado, exigirá menor número de neurônios para mantê-lo.
               
                A história dos 10% é tão difundida que existem livros de autoajuda ensinando como usar os outros 90%! É a “neuróbica”, a malhação do cérebro. Malhar o cérebro é aconselhável, desde que com atividades que estimulem a memória, a atenção, o raciocínio, a imaginação; ou seja, que resultem na formação de sinapses úteis. O sistema nervoso é plástico. Se for estimulado, aumenta seu o potencial. Mesmo com toda a tecnologia existente no século XXI, o melhor estimulante para o cérebro ainda é uma boa leitura. A atividade física regular também é eficiente, uma vez que libera neurotransmissores que melhoram o funcionamento geral do cérebro e da memória.

Mas cuidado com a "neuróbica" que propõe exercícios esdrúxulos como andar pela casa de olhos fechados, ler de cabeça para baixo, comer chucrute com melancia, usar a mão esquerda para escovar os dentes ou fazer outras coisas estranhas com o objetivo de estimular neurônios inativos do cérebro. Isto não faz sentido! Mesmo nos casos de reabilitação após uma lesão cerebral,  a melhora ocorrerá basicamente pela formação de novas sinapses e circuitos.   

                Fiz meu próprio experimento científico no  meu clube. Após uma grave lesão jogando tênis, fiquei três meses com o braço direito completamente imobilizado. Usar apenas a mão esquerda durante três meses provocou, de fato, algumas alterações temporárias no meu cérebro, mas apenas nas áreas que regulam o meu estado de humor. Que coisa mais chata! Infelizmente, não fiquei nem um pouco mais inteligente por isso...

Publicado na revista Tie Break. Blumenau-SC

quinta-feira, 13 de março de 2014

O cérebro de Einstein





Sempre achei que alguma coisa no cérebro de alguns alunos, daqueles que prestavam vestibular para o ITA, era diferente. Esta diferença cerebral parecia separar minha turma do terceirão em dois grupos: Os que gostavam de matemática e os que gostavam do resto! Eu, claro, fazia parte do segundo grupo.  
Afinal, o que há de diferente no cérebro dos grandes matemáticos? Tal curiosidade fez com que o cérebro de Einstein fosse retirado e estudado logo após a sua morte, em 1955.
Os primeiros estudos do cérebro de Einstein foram decepcionantes: ele era menor do que a média masculina. Pesava 1230 gramas aos 76 anos, o que corresponderia a um cérebro de 1352 na adolescência. Nada excepcional. É o tamanho médio de um cérebro feminino. Assim, temos nossa primeira conclusão: tamanho não é documento! O fator determinante de sua inteligência não era um maior número de neurônios. Foi observado que o lóbulo parietal superior direito, área cerebral relacionada ao pensamento matemático e habilidades espaço-visuais, era mais desenvolvido do que a média, contando com conexões mais numerosas e mais complexas entre seus neurônios.  Isso explicava suas habilidades matemáticas superiores. Nesta área os homens costumam, realmente, ser melhores do que as mulheres. Mas se fosse apenas isto Einstein poderia ter passado a vida toda fazendo contas sem descobrir nada novo.


No entanto, Einstein não era apenas um gênio da matemática. Sua inteligência era excepcional em termos globais, fato este, não explicado até recentemente. Um novo estudo do seu cérebro* evidenciou que outra área cerebral, o giro frontal médio, era extraordinariamente mais desenvolvida do que a média. Esta área é responsável pelas funções mais complexas da mente humana: Atenção, organização de informações, planejamento diante de um objetivo, resolução de problemas, pensamentos complexos e abstratos, entre outros. Possibilita também outra importante habilidade: a de imaginar eventos e prever suas possíveis consequências. Isso sim explica muita coisa! Bem mais do que uma habilidade superior na matemática. Esta área nos permite experimentar mentalmente. Para um cientista, independente da área de atuação, a intuição e a imaginação são tão importantes quanto o estudo. Estas habilidades nos permitem criar ideias novas apoiando-se em conhecimentos prévios dentro de certa lógica. Possibilita vivenciar mentalmente experimentos impossíveis de serem vividos na prática. Einstein imaginava-se apostando corrida com um raio de luz ou acelerando-se dentro de um elevador em direção ao espaço. Assim criava suas teorias, muitas só comprovadas anos depois. 
Foi considerado o maior físico teórico de todos os tempos. Ganhador do prêmio Nobel, seu trabalho mudou as ideias vigentes sobre espaço, tempo e matéria.  
Vocês sabiam que o cérebro masculino pesa, em média, 1,5 kg, enquanto o feminino, 1,3kg?  Sim, o cérebro do homem é maior do que o da mulher, tendo, em média, 15% de neurônios a mais. Nem pensem que isto seja uma prova de que homens são mais inteligentes do que mulheres. O cérebro de Einstein demonstrou que a inteligência não depende do tamanho do cérebro e de um maior número de neurônios. O importante é onde estão localizados e a complexidade das conexões entre eles, propiciando uma maior eficiência do trabalho mental. Em termos de inteligência global não há diferenças entre homens e mulheres. Einstein viveu numa época em que as mulheres não tinham as mesmas oportunidades e a ciência era dominada por homens. Com direitos igualitários, a mulher passou a conquistar espaço em todas as áreas, demonstrando que cérebros excepcionais como o de Einstein existem independentemente do gênero do portador.
Mas então para que servem estes 15% de neurônios a mais da maioria dos homens?
Na verdade, tal excesso é proporcional à maior massa corporal do homem, e está localizado nas áreas motoras. Com tantos músculos, é necessário um número maior de neurônios para comandá-los, melhorando assim a eficiência do trabalho braçal! Realmente, os homens são melhores do que nós em rachar lenha, quebrar pedras, empurrar móveis, correr atrás de baratas e carregar nossas sacolas de compras!
Amo muito a matemática cerebral!


Publicado no jornal "O Tempo"de Belo horizonte e na revista Tie Break de Blumenau
* dados científicos extraídos do artigo da revista Brain Journal of Neurology 2013:136;1304-1327  




terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

As Habênulas (II)

As habênulas  são o centro de um sistema considerado antagônico ao  sistema de recompensa do cérebro. O sistema de recompensa é um conjunto de estruturas (sendo a principal os núcleos Accumbens) responsáveis  por premiar, através de sensações de  prazer, os comportamentos importantes para nossa sobrevivência (reprodução, saciar a fome e a sede) através da liberação do neurotransmissor dopamina.  Esta é também liberada em situações do dia a dia que causam emoções positivas, tais como vencer um desafio, estudar e tirar uma nota boa, encontrar os amigos, ganhar um presente ou simplesmente ver a felicidade de alguém amado. As nossas Habenulas são, por outro lado, o centro do sistema de punição ou de anti-recompensa do cérebro, o qual é ativado quando tomamos decisões erradas ou não atingimos um objetivo esperado. Esse processo é importante para que aprendamos com nossos erros, memorizando situações em que o resultado final não foi bom. Sua ativação não resulta, portanto, numa sensação agradável, mas sim em sentimentos negativos como frustração, angústia, e tristeza. Afinal, as habenulas fazem inúmeras conexões sinápticas com o  núcleo accumbens causando a inibição da liberação da dopamina.
                - Pera aí! Para tudo!!! Quer dizer que nosso cérebro tem todo um complexo sistema encarregado de jogar um balde de água fria na nossa felicidade e prazer, comandado pelas  minhas queridas  habênulas?
                - Sim! Exatamente.
                - Mas... Queremos nossa dopamina!!!
                - Minha filha,  você sabe que felicidade e prazer demais também fazem mal.
                - Sim. A hiperativação do sistema de recompensa ou a falta do efeito inibitório das habenulas, resultariam num quadro de felicidade constante e sem motivo.  Seria uma euforia exagerada, um estado de autoestima elevada demais conhecido como “mania”. Esse grave distúrbio psiquiátrico pode colocar o portador em risco, uma vez que ele acha que pode fazer tudo, não percebe as consequências de seus atos, não tem medo de nada e se acha a “a última bolacha do pacote”, apresenta comportamentos de risco e toma decisões financeiras desastrosas!
                É perigoso achar que a vida é só felicidade. Importante é perceber o lado positivo e negativo do nosso comportamento e avaliar suas consequências, aprendendo com elas. As áreas de recompensa do cérebro precisam de limites, neurologicamente falando, da modulação inibitória exercida pelas habênulas. 
Mas o oposto também ocorre. Está comprovado que a hiperativação das habênulas está envolvida nos quadros depressivos, pois causa um estado de humor inverso: angústia, tristeza, incapacidade de sentir prazer, felicidade e de enxergar o lado bom da vida. É como ver o mundo pelos 50 tons mais escuros.
                Como visto, as habênulas e suas interações com o núcleo accumbens atuam na regulação do nosso estado de humor. Quando bem equilibradas, fazem com que tenhamos variações entre tristeza e alegria com intensidade e duração proporcionais à realidade.
                - Então o grau de felicidade e tristeza de cada um depende apenas de uma guerra neuroquímica acirrada entre a habênula e o accumbens?
                  Bem, as coisas no cérebro não são assim tão simples... São trilhões de sinapses entre diversos sistemas antagônicos que fazem com que cada pessoa seja diferente da outra nos mais diversos aspectos da sua personalidade. Simplificadamente, entretanto, tais estruturas cerebrais atuam sim regulando os 50 tons de humor da massa cinzenta!